03/02/2025
O Spotify encontra-se no centro de uma crescente controvérsia sobre a distribuição de royalties, impulsionada pela proliferação de músicas criadas por inteligência artificial (IA) e pelo surgimento de “artistas falsos”.
Estes conteúdos, frequentemente produzidos em massa e criados através de plataformas como o AIVA, Amper Music, Udio ou a Boomy, têm gerado receitas significativas, criando uma situação de desvantagem para os criadores de obras protegidas, devido ao atual modelo de “pooling” utilizado pelo Spotify. Com base neste modelo, os rendimentos gerados por assinaturas e anúncios num determinado período são agrupados e distribuídos proporcionalmente com base na percentagem de reproduções (“streams”) obtidas por cada obra.
Para maximizar receitas, os conteúdos gerados por IA são muitas vezes otimizados para captarem os algoritmos de recomendação do Spotify, acumulando milhões de “streams” e, consequentemente, royalties.
Destarte, os artistas reais enfrentam um cenário cada vez mais competitivo e desigual, em que a remuneração por “streaming” – já amplamente criticada por ser insuficiente – é ainda mais diluída por estas práticas.
Com efeito, a legislação apenas protege a “criação intelectual” original que resulte da intervenção de um ser humano. Assim, obras criadas exclusivamente por “processos” ou “sistemas” de inteligência artificial estão excluídas desta proteção (Artigos 1.º, 11.º e 2.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexo e Artigo 2.º da Convenção de Berna).
Esta proteção foi reforçada no âmbito dos sistemas digitais pela Lei n.º 82/2021, de 30 de novembro, que transpôs a Diretiva 2019/790 e estabeleceu procedimentos de fiscalização, controlo, remoção e impedimento do acesso a conteúdos protegidos pelo direito de autor e direitos conexos em ambiente digital.
Embora a Lei n.º 82/2021 reforce a responsabilização das plataformas pelo conteúdo que disponibilizam – nomeadamente no caso de músicas geradas por IA que utilizem obras protegidas sem autorização – não aborda diretamente a disponibilização de obras geradas exclusivamente por IA, isto é, criações feitas sem recurso a obras preexistentes.
Com efeito, para estas músicas exclusivamente geradas por IA, não há obrigação legal para o pagamento de royalties, uma vez que não são consideradas obras protegidas. No entanto, os mecanismos de controlo de licenças e o avanço exponencial da IA têm evidenciado a insuficiência da legislação atual para assegurar uma distribuição justa de royalties nas plataformas de “streaming”.
Apesar de a União Europeia estar ciente da urgência em atualizar os mecanismos de controlo e transparência, tendo para o efeito aprovado o Regulamento Europeu de Inteligência Artificial (AI Act), a adoção de um compromisso holístico pelas plataformas de streaming, por forma a assegurar uma distribuição equitativa de royalties, ainda está longe de se concretizar.